"Quero fazer livros que resistam às correntes"

Está já traduzido em inúmeras línguas e tem ganho importantes distinções. Para o escritor, "os prémios são importantes mas o mais importante numa obra é a sua resistência".
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Acrítica francesa Eli- sabeth Barillé escreveu no Le Fígaro Ma- gazine que ele é "um Kafka português". E perguntava: "Vai Gonçalo M. Tavares tornar-se um produto de exportação tal como o vinho do Porto e a saudade?" Bom, a resposta é clara: já é.

Aos 40 anos, o escritor tem 190 traduções em curso, é publicado em cerca de 40 países - ainda há duas semanas foi editado na Coreia do Sul -, colecciona críticas elogiosas e é também um dos mais premiados da sua geração. Quer em Portugal, onde já ganhou, por exemplo, o Prémio Ler/Millenium BCP em 2004 e o Prémio José Saramago em 2005; quer no estrangeiro, onde se destacam o Prémio Portu- gal Telecom 2007, o Prémio Internazionale Trieste 2008, o Prémio de Melhor Livro Estrangeiro em França em 2010 e, já este mês, o Prémio Literário dos Jovens Euro- peus 2011.

Em 2006, o inglês Peter Boxall pediu ajuda a mais de cem críticos de todo o mundo para fazer a ambiciosa lista dos "1001 livros para ler antes de morrer". Lá estão autores tão distintos quanto Charles Dickens e J. M. Coetzee, José Sara- mago e Mário Vargas Llosa, J. 1G. Ballard ou William S. Burroughs. E lá está também Gonçalo M. Tavares com aquele que será, muito provavelmente, o seu livro mais aclamado, Jerusalém.

Apesar de tudo, Gonçalo mantém os pés na terra. "Eu guardo sempre uma certa distância em rela- ção ao que me vai acontecendo. O importante mesmo é continuar concentrado e a fazer o que quero. Escrevo apenas aquilo de que sinto necessidade", afirma. "De qualquer maneira", acrescenta, "ser recebido com entusiasmo por grandes escritores dá uma boa energia. Ter o respeito de colegas de várias gerações, é bastante agradável."

E há prémios de facto especiais. "Receber o Prix du Meilleur Livre Étranger foi realmente uma grande honra. Já premiou livros míticos como O Homem sem Qualidades ou Cem Anos de Solidão e tantos outros. Foi agradável a sensação de o Aprender a Rezar na Era da Técnica ficar ao lado de autores, muitos já desaparecidos, mas que me marcaram enquanto leitor - como Musil, Canetti, etc. - e que marcaram a história da literatura", admite Gonçalo M. Tavares.

Se já é difícil enumerar os prémios que ganhou, mais complicado se torna saber de cor todos os livros que publicou ao longo dos últimos dez anos. Romances, poesia, contos, teatro e outras obras difíceis de catalogar, Gonçalo M. Tavares tem mais de 20 títulos, editando em média um ou dois livros por ano. O autor justifica-se dizendo que passou 12 anos a escrever, mas só começou a publicar aos 31 anos e, portanto, tinha muitos livros na gaveta. Mas esta parece uma gaveta sem fundo. Ele desdramatiza: "Tento manter-me concentrado. Mas há alturas em que paro, distancio-me. É bom fazer intervalos. Mas para o meu corpo escrever é muito natural."

"Por vezes, há acontecimentos muito localizados que para mim têm grande importância. O facto de, por exemplo, a actriz Jeanne Moreau, uma figura mítica que eu via nos cinemas enquanto ainda adolescente, se entusiasmar com os meus livros ao ponto de os ler na rádio e de ter o projecto de fazer, em Paris, uma leitura em palco de O Senhor Kraus - só isso me bastaria para ficar contente."

Gonçalo gosta de ver "o que outros artistas" fazem a partir dos seus livros. E têm feito muitas coisas.

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